8 de ago. de 2011

CARRANCAS DO SÃO FRANCISCO

As famosas carrancas do rio São Francisco constituem um enigma de nossa arte popular, na qual ocupam um lugar de especial destaque, tanto pela notável expressão artística como, principalmente, por sua dupla originalidade. As barcas do São Francisco são as únicas embarcações populares de povos ocidentais que apresentaram, de modo generalizado, figuras de proa, pelo menos nos últimos séculos. E estas constituem exemplo único no mundo de esculturas de proas zooantropomorfas. A originalidade é o mais importante atributo de uma obra de arte.
A origem das carrancas do São Francisco deve ter sido a imitação da decoração de navios de alto-mar, vistos nas capitais das Províncias da Bahia e do país pelos pequenos nobres e fazendeiros do São Francisco em suas viagens à civilização. Devemos agradecer ao isolamento em que viviam os habitantes do médio São Francisco o fato de terem criado um tipo de figura de proa inédito em todo mundo: peças de olhos esbugalhados, misto de homem, com suas sobrancelhas arqueadas, e de animal, com sua expressão feroz e sua cabeleira leonina.
Fecha-se assim o ciclo: a evolução das embarcações primitivas levou as figuras de proa, surgidas basicamente com conotações místicas, aos grandes navios, onde sua função era decorativa. E a influência dos grandes navios levou à imitação das suas figuras de proa, com intuito inicialmente decorativo, em pequenas embarcações de uma pequena sociedade rural primitiva. Seus membros, entretanto, deram frequentemente a essas figuras uma conotação mística. Em linhas gerais, a evolução esboçada para as figuras de proa é a própria evolução da arte.

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